As ofensivas contra a ordem democrática contemporânea exigem ações defensivas de caráter preventivo. Essas ações devem ser promovidas, de modo particular, pelos principais agentes institucionais, responsáveis pela guarda da Constituição.

Alessandro Soares*

alessandro soares advogadoNenhuma Constituição é rasgada do dia para noite; sua derrocada não cai como raio de um céu azul. Os blocos que sustentam o edifício constitucional são, geralmente, removidos paulatinamente, até que, em determinado ponto, toda estrutura desaba.

Identificar o fenômeno e antecipar-se a esse é fundamental. É dessa forma que se pode visualizar os debates sobre as interpretações do artigo 142 da Constituição de 1988 e, especificamente, a problemática em torno da previsão de “intervenção militar constitucional”.

Para qualquer pessoa com o mínimo de conhecimento jurídico e honestidade intelectual, é notório que o artigo 142 da Constituição não confere “poder moderador” às Forças Armadas.

Somente com contorcionismo hermenêutico abusivo e absurdo poder-se-ia chegar à essa conclusão. Considerando o contexto político e o histórico nacional, não há dúvidas do que se busca com essas abordagens: legitimar golpe contra a Constituição e seus valores essenciais.

STF e a ADI 6.457
Mas a questão é: como pode essa discussão ter ganhado tamanha dimensão, a ponto de obrigar a nossa Corte Maior a se manifestar sobre o tema ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 6.457-DF?

A resposta à essa indagação está, evidentemente, na dinâmica do processo político, que não pode ser ignorada.

Na verdade, os inimigos da Constituição obrigam os seus defensores a agirem antes que seja tarde. Os possíveis artífices dessas interpretações “criativas” sabem o que estão fazendo. Infelizmente, estes conhecem muito melhor o fundamento último da ordem jurídica e não vivem de miragens normativas.

Assim, hoje temos que defender não só que a Terra não é plana, mas também que inexiste poder “moderador militar”. É esse sintoma das crises do nosso tempo.

O Supremo Tribunal Federal encontrou-se, então, nessa situação absurda de antecipar-se ao jogo político, firmando a interpretação conforme a Constituição. Se os argumentos jurídicos são essenciais para legitimar condutas políticas, então é importante que o principal guarda da Constituição (artigo 102, caput, da CF/88), coloque ponto final ao problema.

Congresso precisa se manifestar
Impende, contudo, dizer que o Supremo Tribunal Federal está no centro dos conflitos contemporâneos; portanto suas decisões jurídicas são cada vez mais confrontadas pelos inimigos da Constituição.

Diante desse quadro, seria mais do que necessário posicionamento do Legislativo. É importante alteração do artigo 142 da Constituição, de modo a negar de forma explícita e direta a existência de qualquer faculdade de intervenção às Forças Armadas no que diz respeito aos conflitos de poderes.

(*) Advogado e sócio do escritório Martins Cardozo Advogados Associados, professor de Direito Constitucional na UPM (Universidade Presbiteriana Mackenzie) e doutor e mestre em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo. Publicado originalmente no portal Conjur

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