Há algum tempo, o Congresso Nacional vem passando por transformações que têm impactado sensivelmente o sistema decisório do Legislativo.

Marcos Queiroz*

marcos augusto arkoO processo de fortalecimento institucional, aliado às mudanças de ordem processual e no perfil da composição parlamentar tiveram como principal consequência o acúmulo de poder nas cúpulas políticas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Por cúpula, entenda-se o presidente de cada Casa e as lideranças a ele alinhadas.

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Diferentemente de momentos passados em que havia maior compartilhamento de poder, atualmente há total concentração nas mãos dos presidentes e os aliados deles. Quem não faz parte do seleto grupo tem participação reduzida nas tomadas decisão. Já o parlamentar solo tem cada vez menos oportunidades de atuação.

Esse fenômeno é mais evidente na Câmara. As últimas mudanças regimentais conferiram à cúpula da Casa maior poder de agenda. A drástica redução dos expedientes de obstrução, com consequente perda de capacidade de intervenção das minorias, deu ao presidente ainda mais controle sobre os rumos das votações.

A recente ampliação do número de comissões tende a tornar mais moroso o ciclo deliberativo nos colegiados temáticos, o que acaba por reforçar a soberania do plenário (obviamente, sob alçada do presidente) como instância decisória.

Há de ressaltar que a depreciação do sistema de comissões já havia sido iniciada na pandemia, a partir da implantação dos processos de deliberação remota e a aplicação de ritos sumários de análise de matérias. Durante esse período, que perdurou por boa parte da legislatura anterior, os colegiados deixaram de funcionar e toda a atividade legislativa foi realizada em plenário. A excepcionalidade agradou bastante aos presidentes, pois detinham comando absoluto de todas as votações.

Com maior autonomia em relação ao Executivo adquirida a partir do controle de parcelas significativas do Orçamento Público, esse consórcio se consolida como força política e promove relativização da disputa entre governo e oposição. Hoje, esse grupo não se situa dentro dessa dicotomia e atua guiado pelo pragmatismo. Embora orbite em torno dos governos, o apoio é condicionado e demanda custo elevado de manutenção.

A cláusula de desempenho eleitoral representa mais 1 fator a contribuir para a concentração de poder, na medida em que ocasiona à ocupação de espaços antes ocupados por partidos afetados por esse mecanismo às legendas maiores, ampliando ainda mais a presença do bloco. A cláusula de barreira, como também é chamada, é responsável por movimentos de aglutinação entre as agremiações partidárias, não só para o cumprimento dos parâmetros, mas também para robustecer grupos políticos.

Por fim, a polarização ideológica, mais acentuada na atual composição do Parlamento, também confere papel decisivo às cúpulas. Embates acirrados entre alas progressistas e conservadoras têm sido constante. Essa é uma realidade presente até mesmo no Senado, tradicionalmente reconhecido como a “Casa da moderação”.

Nesse cenário de forte disputa retórica, a resolução dos impasses naturalmente recai sob esses núcleos de comando.

(*) Jornalista, analista político e consultor especializado em processo legislativo da Arko Advice

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