‘A verdade vos libertará’
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Mentir em todas as ocasiões, mentir sempre, mentir para o mundo inteiro! Ainda que a atividade política inclua mentir, e que a mentira seja inerente às relações humanas, não há registro de presidente da República que tenha mentido publicamente em tão grande escala como o atual — ele mente em público desde que foi entrevistado pela revista Veja, em 1986, a respeito do plano dele de protesto contra o governo da época — que incluía explodir adutora no Rio de Janeiro.
Milton Pomar*
Para ser justo com o ex-capitão, ele não está sozinho no meio militar, na prática de mentir sobre os atos dele. Mentir sobre o que fizeram com opositores políticos da ditadura militar no Brasil é a rotina de todos os torturadores e assassinos, de soldados a generais – e de investigadores a delegados de polícia.
As pessoas eram mortas nos anos 1960/70 “por atropelamento”, “suicídio”, “reagindo a ação policial”, ou simplesmente “desapareciam”. Evidências de torturas em corpos eram sempre negadas, recorrendo-se a explicações ridículas, atestados de óbitos falsos, caixões lacrados etc.
Por que não admitir os crimes? — Para não assumir a crueldade e a covardia? Afinal de contas, não deve ser por medo de condenação por crime contra a humanidade, porque de fato estavam “no poder” — prendiam, torturavam, matavam e desapareciam quem bem quisessem, sem precisar dar satisfação a ninguém.
Apesar de estarem “do lado da força”, e de acreditarem que estavam “fazendo o certo”, nunca tiveram coragem de assumir o que fizeram. Sempre mentiram.
O atual vice-presidente, general Mourão, durante entrevista para 6 repórteres na Globonews, em 2018, mentiu impávido, ao afirmar que “heróis também matam”, referindo-se aos crimes cometidos pelo ex-coronel Brilhante Ustra. Mentiu duplamente.
Primeiro, porque pessoas presas pelo Exército estão sob a guarda do Estado, era responsabilidade legal do servidor federal Brilhante Ustra cuidar daquelas pessoas, nunca torturar ou matar nenhuma delas, nem tampouco deixar que alguém fizesse isso. Segundo, porque torturar e matar pessoas indefesas passa muito longe de qualquer noção de heroísmo.
Integrantes do Ministério Público Federal e do Judiciário Federal, as mais altas instâncias do que se traduz por Justiça no País, mentiram seguidamente no que ficou conhecido como “lawfare”, a perseguição jurídica com finalidade política, contra o ex-presidente Lula e outros integrantes do governo dele.
Ainda está por ser desvendada a farsa jurídica da Ação Penal 470 (AP470), de 2005, denominada midiaticamente “mensalão”, cujo ápice em mentiras foi a condenação de Henrique Pizzolato. Não se sabe se as mentiras foram a causa da inusitada renúncia, em 2014, do relator da AP470 à presidência do Supremo Tribunal Federal e a 10 anos de mandato como ministro, mas um dia a verdade será conhecida, a exemplo do que ocorreu com a “Lava-Jato”…
Por tudo isso, faz sentido o ex-capitão, os integrantes do governo, e os propagandistas apoiadores na Internet mentirem o tempo todo, sobre todas as questões. Aliás, nada mais emblemático do “modus operandi” tão mentiroso que a frase “A verdade vos libertará”, empregada por eles com ares proféticos… Emblemático e paradoxal — sim, é verdade, a verdade nos libertará desse pesadelo neonazista.
(*) Geógrafo e mestre em políticas públicas