Cenário da participação feminina na política
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A Justiça Eleitoral, por exemplo, vem impondo sanções em face do descumprimento das normas que visam garantir o real e efetivo ingresso das mulheres na política. Contudo, a via repressiva, por si só, não é suficiente.
Ana Paula Mantovani Siqueira*
Passadas as eleições municipais de 2016, um índice continua a macular a evolução da democracia brasileira: a efetiva participação das mulheres nas atividades políticas do país. Muito embora a legislação pátria, em clara alusão ao princípio da igualdade de gênero (art. 5º, caput, I, da Constituição da República), busque promover a integração das mulheres na vida político-partidária, dados estatísticos revelam que nossa realidade está longe de refletir os fins almejados pelo legislador.
Atualmente, o Brasil ocupa o 153º lugar no ranking elaborado pela Inter-Parliamentary Union – organização internacional de Parlamentos dos Estados soberanos -, o qual leva em conta o nível de participação feminina no Poder Legislativo e serve para aferir o amadurecimento das democracias, ficando atrás de alguns países árabes do Oriente Médio. Por mais espantoso que esse dado possa aparentar, ele não chega a surpreender, principalmente quando se observa a situação sob o prisma cultural, ligado ao preconceito e à discriminação.
Todavia, outros fatores têm contribuído para que nossa democracia continue nesse estado de letargia. Consoante dados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cerca de 13,51% das candidatas ao cargo de vereador para pleitos municipais de 2016 receberam “votação zero”, fato esse indicativo de que certas agremiações partidárias estão utilizando-se de subterfúgios e artimanhas para burlar as normas que garantem o percentual mínimo de 30% para a cota de gênero. Além disso, não raro nos deparamos com propagandas partidárias desvirtuadas que não promovem o necessário incentivo ao desenvolvimento de atividades político-partidárias pelas mulheres.
Em decorrência desse cenário desolador, a estatística é preocupante: no Brasil, apenas um em cada oito cargos de vereador é ocupado por mulher. Muito tem sido feito para modificar essa conjuntura. A Justiça Eleitoral, por exemplo, vem impondo sanções em face do descumprimento das normas que visam garantir o real e efetivo ingresso das mulheres na política. Contudo, a via repressiva, por si só, não é suficiente.
A questão precisa ser amplamente discutida pelos mais diversos segmentos da sociedade, de modo a abolir a segregação de gênero na política e, em consequência, propiciar meios para a evolução da democracia brasileira.
Nesse contexto, atentos à ação afirmativa que visa integrar as mulheres na vida político-partidária do país, a Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgãos do Ministério Público Federal (MPF), realizarão em Brasília, na quinta-feira (11), às 13h, audiência pública para discutir o tema. O evento contará com a participação de representantes do MPF, da ONU Mulheres, de diretórios partidários, de entidades ligadas à defesa dos direitos das mulheres, além de filiadas de partidos políticos, cidadãos e autoridades vinculadas aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.
O intuito é promover o debate acerca das dificuldades enfrentadas pelas mulheres na política e obter subsídios para a proposição de medidas que reduzam a desigualdade de gênero nos próximos pleitos eleitorais.
(*) Procuradora regional da República, coordenadora nacional do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral no âmbito do Ministério Público Federal