Constituição Federal e suas mutações
- Detalhes
- Categoria: Artigos
A metamorfose da Constituição em números: uma reflexão sobre as emendas constitucionais*
De todo modo, o futuro aparentemente não deverá ser muito diferente, uma vez que, atualmente estão tramitando no Congresso Nacional outras 1.531 PECs, sendo 1.049 na Câmara dos Deputados e outras 482 no Senado Federal. Ou seja, se considerarmos a média de 3,5 PECs promulgadas por ano, na comemoração dos 30 anos do texto constitucional ou Carta Cidadã, em outubro de 2018, também será “celebrada” a 106ª emenda à Constituição.
Jorge Ramos Mizael*
No dia 5 de outubro a Constituição Federal (CF) completará 28 anos da sua promulgação. Em vigor desde 1988, o texto assegurou o estabelecimento do regime democrático de direitos e ficou conhecida como a “Constituição Cidadã”, devido ao seu alcance social.
Ao longo desse período, a Constituição tem sido alvo de um persistente e sistêmico processo de transformação da estrutura originária, chegando ao espetacular número de 99 alterações, sendo 6 emendas constitucionais de Revisão (ECR) e 93 emendas constitucionais (EC).
Adentrando pela procedência das propostas de emendas à Constituição (PEC) vemos que das 93 EC, 60 tiveram a sua tramitação iniciada pela Câmara dos Deputados, dessas, 24 são de autoria do Poder Executivo e as outras 33 são originárias do Senado Federal. Em resumo, do ponto de vista da autoria, Deputados alteraram a CF 36 vezes; Senadores, 33; e o Poder Executivo em outras 24 oportunidades.
Do ponto de vista partidário, os principais autores, entre deputados e senadores, foram, respectivamente, o PMDB (17 EC); o PT (12 EC); o DEM (10 EC) e o PSDB (9 EC).
Dos 35 partidos atualmente registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 12 já viabilizaram alterações na CF, conforme quadro apresentado abaixo.
No que diz respeito ao tempo de tramitação das EC, elas levaram em média 1.388 dias, algo em torno de 3 anos, da sua apresentação, na forma de PEC, até o término de sua análise pelo Congresso Nacional, com a promulgação e a sua publicação no Diário Oficial da União (DOU).
A mediana [1] do mesmo período (apresentação da PEC até publicação no DOU) é de 1.015 dias, algo em torno de 2 anos. Ainda tratando sobre o tempo de tramitação, identificamos a EC 21, de autoria do então senador Élcio Álvares (DEM-ES) [2] – sobre a prorrogação da CPMF, que finalizou a sua tramitação e foi publicada em apenas 121 dias, ou pouco mais de 3 meses. Em contraponto, a EC 81, de autoria do então senador Ademir Andrade (PSB-PA) – sobre a expropriação de terras com culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo, foi a que mais demorou para ser analisada pelo Congresso Nacional e publicada no DOU, com 5467 dias, ou 14 anos. [3]
Se depurarmos, por estados dos parlamentares autores de EC temos: São Paulo e Rio de Janeiro com 8 EC; Santa Catarina com 6; e, Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Sul com 4 EC cada. Por outro lado, parlamentares do Acre, Piauí, Rio Grande do Norte e Tocantins ainda não foram autores de EC.
Até o momento, 7 parlamentares foram autores de mais de uma EC, são eles: então senador Antônio Carlos Magalhães (DEM/BA) - ECs 31 e 86; senador Antonio Carlos Valadares (PP [4] e PSB-SE) - ECs 12 e 64; deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT) - ECs 72 e 89; então senador Esperidião Amin (PP-SC) - ECs 25 e 32; então senadora Ideli Salvatti (PT-SC) - ECs 47 e 59; José Serra (PSDB-SP) EC 2, como deputado, e 40, como senador; e Mauro Miranda (PMDB-GO) EC 26, como deputado, e 43, como senador.
Sobre a parte alterada, vemos que o conteúdo das PECs atingiu apenas a CF em 62 ocasiões; em outras 21 vezes alterou só os ADCT [5] e em outros 10 momentos foram alterados tanto o conteúdo da CF quanto dos ADCT.
Fato é que o elevado número de EC parece não preocupar o Poder Executivo nem os parlamentares, que em alguns casos optam por apresentar PECs a outros tipos de proposição legislativa, como projetos de lei (PL) e projeto de lei complementar (PLP). Tal opção deve-se, principalmente, ao fato de a PEC aprovada pelo Congresso não ser passível de veto presidencial. Ou seja, uma vez aprovada pelas Casa Legislativas, o próprio Congresso procede a sua promulgação. Além disso, pode-se também atribuir a estratégia de apresentação de PEC a tentativa do parlamentar de superar o vício de iniciativa.
De todo modo, o futuro aparentemente não deverá ser muito diferente, uma vez que, atualmente estão tramitando no Congresso Nacional outras 1.531 PECs, sendo 1.049 na Câmara dos Deputados e outras 482 no Senado Federal. Ou seja, se considerarmos a média de 3,5 PECs promulgadas por ano, na comemoração dos 30 anos do texto constitucional, em outubro de 2018, também será “celebrada” a 106ª Emenda Constitucional.
(*) Título original
(**) Cientista Político e assessor legislativo da Queiroz Assessoria Parlamentar e Sindical
NOTAS
__________________________
[1] Medida de localização do centro de uma determinada distribuição numérica desconsiderando os elementos extremos.
[2] Originalmente denominado Partido da Frente Liberal (PFL) sob o Registro definitivo nº 13.067/1986, teve a sua denominação alterada, em 2007, para Democratas (DEM), Res. TSE nº 22.550/2007.
[3] Existem vários fatores que podem implicar no tempo de tramitação de uma proposta legislativa como: momento político; alinhamento com o executivo; empenho dos atores interessados e impacto social da sua aprovação. No caso, da expressiva diferença na tramitação das EC 21/1999 e 81/2014, na nossa visão, a junção de todas as variáveis anteriormente explicitadas, podem explicar, em parte, a grande diferença no tempo de tramitação das proposições.
[4] Inicialmente denominado Partido Progressista Brasileiro (PPB), oriundo da fusão do Partido Progressista e do Partido Progressista Reformador. Registro 19.386/1995. Teve sua denominação alterada, em 1995, para Partido Progressista (PP).
[5] Texto anexo à CF destinado a garanti a transição pacifica do regime constitucional anterior (1969) para o novo regime (1988).