Neuriberg Dias: Cenário Político Pós-Julgamento de Bolsonaro
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- Categoria: Agência DIAP
Neuriberg Dias*
O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro tende a desencadear um acirramento e aprofundamento da crise política no país. O processo não apenas tensiona o ambiente institucional, como também projeta um redesenho do cenário eleitoral e das forças políticas no Brasil.
Em primeiro lugar, nenhum candidato da oposição parece, no atual cenário, reunir força suficiente para vencer o presidente Lula nas urnas. O campo progressista, apesar de seus próprios desafios internos, permanece coeso, o que dificulta sobremaneira a construção de uma candidatura viável por parte da direita.
Em segundo lugar, a direita caminha para a perda de protagonismo político sem um nome forte para liderar esse campo. A ausência de Bolsonaro — seja por inelegibilidade ou condenação — desorganiza a base e enfraquece o discurso unificado que vinha sendo sustentado desde 2018.
Terceiro ponto relevante é o risco de fragmentação ainda maior entre centro e direita. O cenário de "esvaziamento" do PL, partido do ex-presidente, já se desenha. A depender do resultado do julgamento, há tendência de afastamento de antigos aliados, temerosos de prejuízos eleitorais ao manterem vínculos com uma figura condenada.
Isso favorece o surgimento de novos polos dentro do espectro conservador, mas também acentua a divisão, dificultando a montagem de uma frente ampla competitiva às vésperas das eleições gerais.
Nesse contexto, ganha força a pressão pela votação de um projeto de anistia, com sinais claros vindos do PP e do União Brasil que se uniram como federação partidária. A visita recente do ex-presidente da Câmara, Arthur Lira, a Bolsonaro é interpretada como parte desse movimento estratégico: busca-se a construção de uma alternativa de sobrevivência política e eleitoral do ex-presidente Bolsonaro.
No entanto, o sucesso dessa articulação depende diretamente da disposição do grupo bolsonarista em ceder espaço político e construir alianças mais amplas — o que, até o momento, parece limitado pela tendência de concentração interna e resistência à partilha de poder.
De todo modo, a anistia de Bolsonaro se apresenta como a única saída possível para manter o grupo unido e preservar a aliança do centrão no Congresso Nacional. Trata-se de uma tentativa de atravessar o atual ciclo de instabilidade e chegar a 2026 e 2030 com fôlego político suficiente para disputar, novamente, o Planalto em condições mais favoráveis.
*Jornalista, Analista Político e Diretor de Documentação do DIAP.