Às vésperas de promover reforma ministerial que reflita melhor a correlação de força da nova configuração política pós-eleição municipal, o presidente Lula (PT) tem a oportunidade de ir além da simples acomodação de interesses políticos. Este momento pode ser utilizado para reforçar a base de apoio no Congresso Nacional e na sociedade, ao promover mudanças que também melhorem a qualidade da gestão, elemento indispensável à sustentação e continuidade do projeto de governo.

Antônio Augusto de Queiroz*

Antonio Augusto Toninho Diap
Para tanto, é necessário inventário detalhado da atuação dos atuais ministros, abrangendo tanto as entregas feitas em cada pasta quanto a capacidade de defesa do governo como um todo. Tal diagnóstico vai permitir avaliar a eficácia de cada titular e o nível de comprometimento desse, com as diretrizes e metas governamentais, servindo de base para decidir quem permanece e quem será substituído.

O papel de ministro de Estado combina 2 dimensões fundamentais: a de gestor e a de representante político. Na dimensão de gestor, exige-se habilidades para formar e liderar equipes, além de algum grau de conhecimento técnico na área de atuação. Na dimensão de representação, cabe ao ministro legitimar, sustentar e defender a agenda do governo, comunicando-se mais com o público externo do que com o interior da máquina pública.

E isso requer que, nas manifestações públicas, ele transmita confiança, seriedade e credibilidade. Essa função de representação não é apenas simbólica, mas também estratégica, especialmente em tempos de polarização.

Cada presidente, ao recrutar os auxiliares para postos estratégicos, como o de ministro de Estado, define os critérios com base na visão de mundo e nos compromissos assumidos durante o processo eleitoral e pós-eleitoral. Esses critérios, geralmente incluem ética, integridade e 5 outros fatores fundamentais: 1) critérios políticos, 2) ideológicos, 3) partidários, 4) regionais e 5) de gênero. Entretanto, não basta atender a esses parâmetros; é imprescindível que o escolhido possua habilidades de liderança e competência gerencial.

Estes atributos precisam estar interligados para garantir o bom desempenho na gestão e em defesa do governo. Nem sempre, contudo, esses requisitos são atendidos, especialmente quando o fator “indicação política” é o que predomina na escolha.

O presidente Lula, no terceiro mandato à frente do Executivo, demonstra plena consciência dessas demandas. Ao compor o ministério, Lula valorizou a lealdade, prestigiou partidos e lideranças decisivas para a vitoriosa eleição e ampliou de maneira significativa a presença feminina no governo, em relação ao governo Bolsonaro.

No entanto, decorridos 2 anos de governo, é necessário ajustar rumos. A nova realidade política pós-eleição municipal e a iminente eleição para as presidências da Câmara e do Senado demandam governo mais coeso e articulado. Essa adequação inclui tanto a substituição de ministros que não corresponderam às expectativas quanto a redistribuição de forças dentro do governo para atender à nova realidade política do País.

O processo de mudança é natural, seja para ajustar a base à correlação de forças políticas, seja para corrigir deficiências de gestão ou comunicação. O presidente Lula, que exerce pela terceira vez a chefia do Poder Executivo, sabe disto como ninguém. E, portanto, ao promover reforma no ministério, irá levar em consideração esses aspectos.

Aliás, ao trocar o titular da Secom, certamente já levou em consideração isto, ou seja, que a comunicação do governo estava deficiente e precisaria melhorar a gestão e reforçar a presença e qualidade na comunicação digital, segmento em que o governo estava perdendo de goelada para a oposição extremada.

Com a troca, pretende comunicação mais assertiva, que não somente combata a desinformação e fake news como atue de forma mais efetiva no marketing governamental para “conquistar corações e mentes”.

Embora o ideal fosse impor padrão uniforme aos partidos da base aliada, isso nem sempre é viável. Ministros com o perfil ideal — leais, ágeis, criativos e eficazes tanto nas entregas quanto na defesa do governo — são raros. Exemplos positivos, como o titular da AGU (Advocacia-Geral da União), que propôs o Prêmio Eunice Paiva de Defesa da Democracia, ilustram a combinação ideal de competência técnica e compromisso com os valores democráticos.

Outra estratégia seria realocar ministros eficazes para pastas de maior visibilidade, como, por exemplo, o ministro dos Portos e Aeroportos, o deputado licenciado Silvio Costa Filho (PE), do Republicanos, e assim explorar de forma mais estratégica a capacidade de articulação política.

Com experiência e habilidade política, o presidente Lula tem plenas condições de promover reforma ministerial que combine competência, articulação política e compromisso com as diretrizes do governo.

Ao ajustar a equipe, desde que a coalizão não lhe imponha nomes em desacordo com esse perfil, Lula não apenas poderá reforçar a estabilidade da base de apoio, como também poderá construir as condições para legado de realizações que fortaleça a credibilidade do governo e o projeto político que representa.

(*) Jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV. É sócio-diretor da empresa “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais”, foi diretor de Documentação do Diap e é membro da Câmara Técnica de Transformação do Estado, do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, e do Cdess (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável) da Presidência da República - Conselhão.

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