A cada eleição no Brasil, novas regras são criadas e incorporadas ao sistema eleitoral, que dificulta a compreensão dos eleitores e até dos candidatos e partidos políticos, como ocorreu neste pleito proporcional, que elegeu deputados federais, estaduais e distritais, no caso do DF.

Neuriberg Dias*

Dentre as inovações colocadas em prática, como a do fim das coligações e a instituição das federações, a aplicação da exigência de desempenho mínimo para partidos e candidatos para participação na distribuição das vagas remanescentes ou sobras é a que tem motivado questionamentos no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Essa mudança, relativa à distribuição das vagas não preenchidas com a aplicação dos quocientes partidários, foi instituída pela Lei 14.211/21. Essa lei que modificou o artigo 109, § 2, da Lei 4.737/65, adotou 4 critérios para que partido ou federação possa ter representação proporcional:

1) atingir o quociente eleitoral e 10% desse pelos candidatos;

2) exige maior média e atingir 80% do quociente pelos partidos ou federações, além de 20% desse quociente pelos candidatos;

3) requer maior média e 80% do quociente dos partidos e federações, sufragando os mais votados sem exigência de votação mínima;

4) somente se aplica quando nenhum partido ou federação do estado tiver atingido o quociente eleitoral, distribui todas as vagas entre os candidatos mais votados, sem qualquer outra exigência.

bancadas regras sobras

O TSE, ao disponibilizar os votos válidos que são obtidos por meio da soma dos votos nominais e de legenda computados aos partidos e federações possibilita, de forma didática, fazer avaliação da composição da Câmara dos Deputados levando em consideração as novas regras que entraram em vigor nas eleições de 2022.

Comparada às que estavam em vigor no pleito de 2018, que somente fixava o critério das maiores médias como condição para a participação dos partidos e dos candidatos na distribuição dos lugares de sobra, a saber:

1) houve baixa distorção de uma regra para outra, tendo como base a votação atual. Ao todo, haveria 33 ou 6,43% de mudanças na composição eleita para a Câmara;

2) 5 partidos foram favorecidos com essa mudança de cálculo: PL, que fez 99, teria feito 93; União Brasil, que fez 59, teria 56; MDB, que fez 42, teria 39; Republicanos, que fez 41, teria 37; e PSC, que fez 6, teria 5;

3) 7 partidos foram prejudicados com a vigência da nova regra: PSDB/Cidadania, que teria feito 25, ao invés de 18; PSB, que teria feito 16, ao invés de 14, Podemos, que teria feito 15, ao invés de 12; PSol/Rede, que teria feito 15, ao invés de 14; Solidariedade, que teria feito 5, ao invés de 4; Novo, que teria feito 4, ao invés de 3; e PTB que teria feito 3, ao invés de 1;

4) 7 partidos não seriam impactados: PT, PCdoB e PV; PP, PSD, PDT, Avante, Patriota e Pros, que mantiveram o tamanho das respectivas bancadas eleitas, independentemente, da regra da distribuição das sobras;

5) reduziu a quantidade de vagas ocupadas pelas sobras. Das 513 cadeiras da Câmara, 168 foram distribuídas pelas sobras. Se essas regras estivessem em vigor nas eleições de 2018, seriam 199 das 513. E, em 2018, os eleitos pelas regras em vigor, seriam 249 das 513 cadeiras;

6) manteria a composição partidária eleita para a próxima legislatura. Ao todo, seriam entre 19 e 23 siglas considerado as federações do PT, PCdoB e PV; PSol/Rede; e PSDB/Cidadania; e

7) houve média de 24% de votos descartados com a vigência das novas regras. Isso ocorre quando os partidos ou federações não atingem o mínimo de 80% e deixam de fora candidatos bem votados para concorrer às vagas. Como exemplo, podemos citar o ex-governador e ex-senador, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), que seria eleito se estivesse em vigor somente a regra por média para distribuição das sobras;

8) nos estados com maior número de vagas para Câmara, houve menor impacto do voto descartado, sendo até 15%: RS, SP, RJ, MG, BA, PB, PR, MA, PE e CE; acima de 15% a 30%: GO, PI, AM, SE, SC, AL; acima de 30% a 45%: PA, MS, RR, DF, ES e TO; acima de 45%: AC, RN, MT, RO e AP.

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Como conclusão, são positivas as mudanças no sistema político no sentido de priorizar a reorganização institucional rumo à redução da fragmentação partidária para facilitar a governabilidade. Mas são negativas, quando as mudanças são feitas para criar determinado “favorecimento” eleitoral, quando coloca em risco a representatividade da sociedade no Parlamento.

Houve tática de “terra arrasada”, com a exigências das novas regras, o uso de recursos públicos via orçamento e a tentativa feita pelo PTB de questionar a constitucionalidade da criação de federações, que se tivesse êxito no STF (Supremo Tribunal Federal) teria potencial, seguramente, de promover enorme desproporcionalidade na representação das minorias na Câmara, em particular, com redução dos partidos de esquerda no Legislativo.

A frase do deputado federal e presidente da Assembleia Nacional Constituinte (1988), Ulysses Guimarães, em resposta à jornalista — “se você acha esse Congresso ruim, espere até o próximo” —, poderia ganhar nova versão, caso não existisse as federações para a Câmara que emergiu das urnas para próxima legislatura.

(*) Jornalista, analista político, diretor de Documentação licenciado do Diap e sócio-diretor da Contatos Assessoria Política

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