2021: análise das agendas conflitantes no Congresso
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- Categoria: Agência DIAP
Após a eleição das mesas diretoras do Congresso Nacional, para Câmara dos Deputados, presidente Arthur Lira (PP-AL), e Senado Federal, presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), houve, pode-se chamar assim, ajuste nas pautas em tramitação no Poder Legislativo. Estavam em disputa 3 agendas nas casas legislativas. Algumas ‘caminharam’, outras esbarraram em divergências e falta de acordo político, e algumas outras foram derrotadas, na Câmara ou no Senado.
André Santos1 e Neuriberg Dias2
As 3 principais agendas são: 1) partidária — lei da improbidade administrativa, mudanças no regimento da Câmara, alteração da legislação eleitoral e no repasse das emendas do Orçamento da União; 2) econômica — privatizações, reformas Tributária e Administrativa, e precatórios; e 3) ideológica — voto impresso, aborto, ensino domiciliar (homeschooling), ‘PEC da Bengala’ e tipificação de terrorismo.
Com atores (condutores) e caminhos bem definidos para articulação dessas agendas no Congresso, restou à oposição resistir para evitar mais retrocessos na legislação trabalhista, no Estado de Bem-Estar Social e em defesa dos pilares da democracia — os poderes da República.
As situações adversas em relação às agendas na Câmara e Senado foram moldadas pela pauta remanescente do período mais crítico da pandemia da covid-19. Do mesmo modo, em relação às conjunturas política e econômica impostas pelas variações do humor e despreparos do presidente Jair Bolsonaro (PL) para lidar com os graves problemas do País.
Câmara dos Deputados
Lira, assim que assumiu a presidência da Casa levou consigo pauta própria para os deputados e os chamados políticos de modo geral. Ele inviabilizou, por exemplo, qualquer possibilidade de votação de pedido de impeachment do presidente da República na Casa — são mais de 140 pedidos até o momento. E tocou parte da agenda econômica desenhada pelo antecessor, deputado Rodrigo Maia (sem partido-RJ), que pode retornar ao DEM.
Ele conduziu as privatizações da Eletrobras (MP 1.031/21) e dos Correios (PL 591/19), que andaram na Câmara. Aprovou ambas as matérias na Casa. A segunda aguarda deliberação em comissão (CAE) no Senado.
Deliberou sobre a independência do Banco Central (Lei Complementar 179/21) e aprovou também a chamada PEC dos Precatórios (PEC 23/21), cujo propósito foi a abertura de espaço fiscal no Orçamento federal para votar o Auxílio Brasil, que é o novo programa de benefício social, em substituição ao Bolsa Família, com o qual Bolsonaro pretende puxar a recandidatura dele.
Os deputados aprovaram ainda a MP 1.045/21, que promovia alterações na legislação trabalhista. Todavia, felizmente, a MP foi rejeitada pelos senadores, com trabalho eficaz do movimento sindical no Senado.
O presidente da Câmara pautou, porém, sem compromisso com o resultado, as propostas da chamada “pauta ideológica” patrocinada pelo Planalto e articulada por aliados do presidente Bolsonaro. Entre essas, destaque para a PEC 135/19, conhecida como “PEC do Voto Impresso”.
A proposta foi rejeitada no mérito em comissão, mas mesmo assim a votos no plenário e caiu, porque não atingiu os 308 votos necessários para aprovação. Foi arquivada e não há, nesta legislatura, possibilidade de voltar à discussão.
Outras matérias defendidas pela chamada ala ideológica do presidente da República foram o homeschooling, com vários projetos tramitando na Casa, sendo o principal, o PL 3.179/12, sob a relatoria da deputada Luiza Canziani (PTB-PR).
Também entram na pauta ideológica, o PL 1.595/19, que tipifica os chamados crimes de terrorismo. A matéria teve a urgência rejeitada pelos deputados. O que, em certa medida, demonstra que a maioria dos deputados não têm interesse em que este projeto avance.
Senado Federal
Rodrigo Pacheco chegou ao Senado como aliado do governo e do presidente Bolsonaro. Segurou, por exemplo, o quanto pôde a criação e instalação da CPI da Covid-19. Evitou pautas que pudessem desagradar aos aliados do governo e da ala ideológica de Bolsonaro.
Com a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), o presidente do Senado foi obrigado a garantir a instalação e o funcionamento da CPI da Covid-19 e o bom andamento dos trabalhos, que durou 6 meses, e produziu resultados relevantes para a sociedade brasileira.
Com a ascensão do nome dele, surgiu a possibilidade de se apresentar como alternativa à Lula e Bolsonaro, o que a imprensa tem apelidado de “terceira via” nas eleições presidências de 2022. Pacheco desembarcou do DEM, que se fundiu com PSL, e migrou para o PSD, sigla que o anunciou como pré-candidato ao Palácio do Planalto.
A alteração no tabuleiro político do jogo eleitoral trouxe reflexos e impactos imediatos nas relações políticas e na condução da agenda do Congresso Nacional e do Senado Federal.
A Casa começou a destravar agenda de maior consenso entre os senadores e passou a mediar conflitos e rivalizar com pontos da agenda de Lira e ainda a questionar pontos da agenda econômica do governo, coordenada pelo ministro Paulo Guedes (Economia).
Agendas travadas
Pelo menos 3 agendas foram brecadas no Senado. A primeira foi PL 595/19, de privatização do Correios, que depois de aprovado pelos deputados, está ‘estacionado’ na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos). O texto tem como relator, o senador Marcio Bittar (PSL-AC).
Outra foi a rejeição da medida provisória que promovia modificações na legislação trabalhista, a MP 1.045/21, e por fim, a PEC 32/20, que trata da Reforma Administrativa, que além da pressão contrária exercida pelas entidades sindicais do funcionalismo, teve avaliação contrária antecipada de alguns senadores, o que inibiu a votação da proposta pelos deputados.
Agenda positiva do Senado
Neste quesito, foi aprovado o PL 2.564/20, que cria o piso salarial para os enfermeiros de R$ 4.700, que desagradou, em especial, governadores e prefeitos.
A pressão agora se volta para os deputados. Todavia, o texto foi despachado para as comissões sem previsão de votação. Ou seja, Arthur Lira não pretende dar celeridade à discussão e votação do projeto na Casa revisora.
O que se pode perceber em relação às agendas em disputa no Congresso é a tentativa frequente de flexibilizar ainda mais direitos dos trabalhadores, com pretexto corriqueiro de geração de empregos (mesmo com o fracasso evidente da Reforma Trabalhista, aprovada com esse fito) e o aprofundamento da política neoliberal, que vai retirando cada vez mais o Estado das obrigações mais básicas com o cidadão.
Para evitar mais retrocessos, mesmo em ano eleitoral, vai ser necessário atenção redobrada em relação às agendas em debate no Congresso e ainda trabalhar, muito, para melhorar a representação política e eleger deputados e senadores mais afinados com os desejos e as necessidades da amplíssima maioria da população brasileira.
1 Analista político licenciado do Diap, jornalista, especialista em Política e Representação Parlamentar e sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.
2 Analista político, assessor técnico licenciado do Diap e sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.