O governo intensificou as negociações para votar, nesta quarta-feira (3), a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 23/21, que altera a forma de pagamento dos precatórios, que são as dívidas da União reconhecidas pela Justiça. Para o governo é essencial aprovar a proposta, pois assim libera espaço fiscal no Orçamento para garantir recursos para liberar o Auxílio Brasil, nome rebatizado do programa Bolsa Família, que hoje paga em torno de R$ 190 aos beneficiários. O Auxílio Brasil pretendido por Bolsonaro/Guedes é de R$ 400.

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A EC (Emenda à Constituição) 95/16, do Teto de Gastos, foi aprovada em 2016 e começou a valer em 2017. Trata-se de mecanismo que impede aumento de despesas sem controle do governo. Hoje, o teto determina que as despesas do governo só podem crescer o equivalente à inflação oficial, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), de julho de um ano a junho do ano seguinte.

A PEC dos Precatórios (PEC 23/21) muda esse cálculo.

A correção continuaria sendo pelo IPCA, mas de janeiro a dezembro do mesmo ano. Como a inflação disparou este ano, o índice de correção sobe e também o limite de despesas para o ano que vem. A alteração permitiria ao governo gastar R$ 47 bilhões a mais em 2022. Ou seja, isso furaria o chamado “teto de gastos” do governo e implodiria, para desespero da ortodoxia neoliberal que comanda o governo de plantão.

Fundef e abatimento das dívidas
Ao propor o parcelamento das dívidas obtidas pela União em condenações na Justiça, a medida tende a afetar o cronograma de recebimentos dos docentes de estados que venceram causas judiciais relacionadas ao antigo Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), que vigorou de 1997 a 2006.

Outro problema, é que a PEC cria diferentes artifícios que prejudicam a categoria.

Um desses é a possibilidade de os estados ou municípios receberem os valores somente no final do exercício seguinte, com abatimento de 40% do total. Isso pode ocorrer no caso de a União não conseguir repassar as verbas dentro do limite estabelecido pela PEC.

Pagamento dos precatórios
Além disso, a proposta fixa limite para o pagamento dos precatórios, que são dívidas que o governo tem com pessoas e empresas que já foram reconhecidas pela Justiça e não podem mais ser questionadas e devem ser pagas.

Pelo texto da PEC, precatórios acima de R$ 66 milhões seriam parcelados em 10 anos. Assim, o governo conseguiria margem de mais R$ 44,5 bilhões no orçamento para colocar em prática, por 1 ano, o chamado Auxílio Brasil, de R$ 400.

As duas manobras juntas liberariam mais de R$ 90 bilhões para o governo em ano eleitoral. O governo usaria quase metade, cerca de R$ 50 bilhões, para bancar parte do novo programa social, o Auxílio Brasil.

Os articuladores do governo insistem na votação nesta quarta-feira, marcada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que vem pressionando os deputados, exigindo presença no plenário da Câmara depois do feriado.

A PEC enfrenta resistência entre os deputados. Ou seja, o governo ainda não conseguiu os 308 votos necessários para votar a proposta em 1º turno.

Divergências
“A gente precisa entender esse momento, mas a gente tem espaço dentro do Orçamento, com medidas austeras, com medidas importantes, mas que a gente conseguiria encontrar espaço orçamentário para diminuir os gastos públicos e ter medidas que podem ajudar essa parte da população. Quando a gente faz o contrário, quando a gente fura o teto ou cria o buraco no teto para poder fazer isso, você está prejudicando essa população. Você pode até dar de um lado, mas está tirando de outro, porque você está gerando inflação e gerando uma carga tributária ou mesmo uma dívida de longo prazo ainda maior. Quem vai pagar? No Brasil de hoje é principalmente a população mais pobre, que é quem proporcionalmente paga mais imposto no Brasil”, disse o deputado Paulo Gamine (Novo-RJ).

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), disse que o importante é criar recursos para quem precisa do auxílio.

A proposta, como se vê, é eleitoreira. Com o calote nos credores, o governo espera arrumar recursos para entrar na corrida eleitoral do próximo ano, com algum cacife. Importante destacar, que o Auxílio Brasil, se aprovado for pelo Congresso, terá validade só até 31 de dezembro de 2022.

Desse modo, ganhando ou perdendo as eleições de outubro próximo, Bolsonaro só tem compromisso com essa agenda social em razão da disputa eleitoral. A obsessão dele é apenas com a reeleição e não com os problemas porque o povo tem passado em razão das consequências da pandemia de covid-19.

Demagogia governista e calote
“As pessoas que tiveram sua capacidade de sustentar a sua família atingida pelo isolamento social da pandemia precisam continuar a ser ajudadas até a completa normalidade. Não é a única solução, mas é a melhor solução, e nós vamos mobilizar os parlamentares. Já tem compromisso de presença amanhã, e queremos aprovar em 1º e 2º turnos a PEC dos precatórios e garantir o Auxílio Brasil para os brasileiros que mais precisam”, afirmou Barros.

Especialistas em contas públicas e economistas do setor financeiro afirmam que o governo está propondo calote nos precatórios e que as manobras desrespeitam a Emenda do Teto de Gastos, o que prejudica a credibilidade do País.

O controle austero das despesas federais, o teto de gastos, em razão das eleições, deixou de ser para Bolsonaro, por ditame do projeto neoliberal, algo indiscutível ou imutável. Isto é, o problema não é mais técnico, é político.

“Nós vamos ter uma soma em torno de R$ 95 bilhões no ano que vem que não existiria não fossem essas mexidas na Constituição. Isso é visto pelos agentes econômicos, pelos investidores, pelos analistas, por todos, como algo que aumenta o risco fiscal, desrespeita os princípios da responsabilidade fiscal, e é assim que os juros estão aumentando, a perspectiva de crescimento econômico para o ano que vem diminuindo. E isso afeta a vida de todos, de todos os cidadãos. Por que? Porque esse crescimento mais baixo vai significar menos emprego e menos renda”, disse Felipe Salto, diretor da IFI (Instituição Fiscal Independente) do Senado Federal.

O auxílio é essencial. Todavia, o governo pretende pagá-lo, se conseguir aprovar a PEC dos Precatórios no Congresso, dando calote nos credores que já tiveram os créditos reconhecidos pela Justiça, e assim, o Executivo é obrigado a pagar.

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