Bolsonaro tem muitos eleitores porque ainda não foi confrontado*

Outros candidatos irão canalizar a esperança de mudança pela direita, de maneira mais conciliatória, generosa e menos autoritária. Quando isso ocorrer Bolsonaro perderá parte de seus votos.

Alberto Carlos Almeida*

Há quem acredite que a experiência fascista não é viável em um país tropical. Aqui a malemolência, o jeitinho e o primado das relações pessoais sobre as impessoais impede a perseguição aberta e generalizada de grupos de pessoas com base em suas características adscritas ou mesmo suas escolhas de vida.

Assim, nosso preconceito é velado, é cordial, o que falamos um dia não fazemos no dia seguinte, a rejeição verbalizada a um transexual não se materializa em seu isolamento ou rejeição social. Isto é, nós brasileiros somos capazes de rejeitar um comportamento ou escolha social, e mesmo assim sermos amigos de seu portador.

A coerência não é nosso forte. Aliás, estamos bem longe dela, e isso nos afasta de qualquer coisa que flerte com o que se convencionou chamar de fascismo. Em suma, o Brasil está muito mais próximo de uma Itália do que de uma Alemanha. Aqui, até mesmo o autoritarismo seria brando. Se tudo isto é verdade, muitos indagam por que Bolsonaro vem tendo tanto sucesso. Me arrisco a afirmar que isto ocorre porque ele ainda não foi confrontado com o país tropical.

Bolsonaro é claro, transparente, busca ser coerente, é agressivo, bate boca em público, arrisca-se a maltratar um eleitor. Quem gosta dele o vê como o homem forte que tem condições de salvar o Brasil da perdição na qual se encontra.

O seu estilo, portanto, é aprovado. Justifica-se a natureza agressiva de suas falas e ações: ela sinaliza coragem, força, pulso forte, determinação, só assim o Brasil terá jeito. Somente alguém com estas características pessoais seria capaz, na visão de quem vota nele, de consertar o país.

O país tropical está cansado da radicalização e do conflito. Alckmin e Lula já perceberam e verbalizaram isto. Os 2 vêm afirmando que o eleitorado está em busca de paz, quer a redução das brigas motivadas pela política que envolvem amigos e familiares. A fala dos 2 é típica daqueles que querem conquistar o centro político.

Mais do que isto, ela está fundamentada em um profundo conhecimento prático da opinião pública: Lula foi eleito presidente duas vezes e elegeu Dilma outras duas, Alckmin foi governador de São Paulo 4 vezes. Os 2 são especialistas em eleições majoritárias. Por outro lado, Bolsonaro é deputado federal, alguém que precisa de nicho eleitoral para ter sucesso, afinal, deputados são eleitos pelo sistema proporcional.

Foi muito interessante ver Bolsonaro recentemente trocando de partido, ele saiu de um que era pequeno e foi para outro menor ainda. Uma criança sabe que para ser eleito presidente de um país continental com o 4º maior eleitorado ativo é preciso ter estrutura, ter máquina.

Os candidatos a presidente precisam percorrer o país. Em cada aeroporto que chegam são recepcionados em carreata, vão a inúmeros eventos, dão várias entrevistas para a mídia, reúnem-se com prefeitos e vereadores. Candidatos nanicos dificilmente têm estrutura para isso.

Há aqueles que mostrarão os vídeos de Bolsonaro chegando em alguns aeroportos e sendo recepcionado por centenas de pessoas. Seria importante acompanhar suas carreatas, qual o trajeto e o destino final. Creio que dificilmente elas passariam pelas periferias de nossa cidade sem que houvesse o alto risco de algum incidente.

Bolsonaro é candidato de nicho, do nicho não tropical do Brasil. Sua intenção de voto tenderá a cair na medida em que os eleitores insatisfeitos com a situação do país, e que rejeitam Lula e o PT, descobrirem que o mundo dos candidatos não se resume a Bolsonaro.

Outros candidatos irão canalizar a esperança de mudança pela direita, de maneira mais conciliatória, generosa e menos autoritária. Quando isso ocorrer Bolsonaro perderá parte de seus votos. Ele corre o risco de, assim como aconteceu com Marina em 2014, sair da campanha menor do que entrou. Aliás, ao mudar de partido ele já sinalizou com clareza este risco.

(*) Título original
(**) Diretor do InteliGov e do Instituto Análise. Foi articulista do Jornal Valor Econômico por 10 anos. Autor do best-seller “A cabeça do Brasileiro” e diversos outros livros. Publicado originalmente no Poder360

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